Três jovens se refugiam e tentam sobreviver à primeira onda da epidemia de AIDS que assolou o mundo no começo da década de 1980. Esse é um breve resumo diante dos inúmeros desdobramentos que o filme Os Primeiros Soldados, de Rodrigo de Oliveira, oferece ao público. Protagonizado por Johnny Massaro, Renata Carvalho e Vitor Camilo, o longa-metragem será exibido pela primeira vez em terras capixabas, em sessão presencial, na abertura do 28º Festival de Cinema de Vitória – Reencontro, no dia 21 de junho, às 19 horas, no Centro Cultural Sesc Glória, na cidade de Vitória.
O filme, quarto longa-metragem do diretor, percorre o circuito de festivais desde 2021 e já foi premiado no 23º Festival do Rio, na capital carioca, na 25ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em MInas Gerais, no 52º International Film Festival of India, na Índia, e no 70º International Film Festival Mannheim-Heidelberg, na Alemanha. A recepção, tanto da crítica quanto do público, tem sido calorosa em todas as exibições da obra. “Sinto que há um encontro entre o desejo do espectador e o desejo do filme: falar sobre algo que é inédito, pelo menos na ficção do cinema brasileiro, algo que nos toca como comunidade e que foi feito para ser experimentado em comunidade”, afirma Rodrigo.
Embora o filme se passe no início da epidemia de AIDS no Brasil, quando tudo ainda era incerto, a obra reverbera a luta e o prazer de estar vivo. “O comum é que filmes sobre esse tema falem sobre morrer de AIDS, e ‘Os Primeiros Soldados’ é uma imaginação sobre a vida com AIDS, muito antes de falarmos em pessoas ‘que vivem com HIV’. A vida como algo a ser celebrado e compartilhado até o último minuto. Na saída de uma pandemia global, como a que atravessamos atualmente, eu sinto que estes sentidos todos são muito mais relacionáveis, inclusive para os espectadores de fora da comunidade LGBTQIA+”.
Segundo o diretor, que também é roteirista e montador da obra, abordar o início da AIDS no mundo, além de um resgate histórico, é uma oportunidade de falar sobre as questões que atravessam a comunidade LGBTQIAP+. “A identidade de toda pessoa LGBTQIAP+ é marcada pela crise da AIDS, de uma forma ou de outra. A homofobia reinante ainda em 2022 tem raízes diretas na devastação causada na nossa comunidade pelo vírus e no estigma que daí surgiu. Quando eu pensava nas minhas próprias experiências como jovem gay, saindo do armário apenas dois anos depois do coquetel de remédios que salvou tantas vidas, a presença desse estigma era muito frontal na minha experiência cotidiana”.
REPRESENTATIVIDADE
Inteiramente filmado no Espírito Santo, Os Primeiros Soldados conta com uma equipe formada majoritariamente por profissionais locais, além de diversa no que se refere à identidade de gênero, orientação sexual e raça. “A equação é muito simples: elencos e equipes diversos geram filmes melhores, e ponto. ‘Os Primeiros Soldados’ é um filme sobre uma comunidade, e ele precisava ser feito por essa mesma comunidade, e isso porque as vivências particulares dos membros LGBTQIAP+ do elenco e da equipe informavam diretamente a narrativa, o compromisso com o trabalho e a própria dinâmica do set”.
Essa diversidade se reflete na construção das múltiplas vivências que são apresentadas na tela. “Quando o filme foi exibido em Londres, alguém da plateia perguntou sobre a diversidade nas duas grandes cenas de boate que existem no filme, e a resposta é igualmente simples: seria mentiroso encenar uma pista de dança gay em 1983 (ainda ditadura, ainda semi-clandestina, ainda perigosa àqueles que tomavam parte dela) sem o protagonismo preto, pardo e trans, e sem um recorte de classe radical”.
FESTIVAL
A história de Rodrigo de Oliveira atravessa a história do Festival de Cinema de Vitória, onde ele já esteve presente como crítico, curador e realizador. “O Festival de Vitória foi o espaço que me formou como militante do cinema brasileiro – mais do que espectador, militante. Por ser historicamente associado ao formato do curta, mais diverso e inventivo que o longa, por ter sempre decidido trazer realizadores para dividir suas experiências com o público capixaba, por ter sido sempre gratuito, popular e massivo. Num momento de opressão do produto americano, da facilidade ilusória do streaming, um festival que agora retorna ao encontro presencial, que mantém os mesmos valores que tinha desde o seu nascimento, segue com a mesma missão, e ela é fundamental: mais que formar público, é formar defensores da causa que é o cinema brasileiro”.
Como grande defensor do audiovisual produzido no Brasil, Rodrigo realizará a primeira exibição do filme no Espírito Santo, dentro da programação do 28º FCV – Reencontro. As expectativas para encontrar o público local são altas e a sessão promete ser emocionante. “Em todo esse caminho, o sonho era sempre por essa primeira sessão em casa, que guardamos com todo o carinho para acontecer dentro do Festival de Vitória. Esse filme rodou o mundo para se tornar ainda mais capixaba, as perguntas que respondo com mais interesse lá fora são sobre a curiosidade que o filme desperta sobre a nossa terra. O elenco todo, principal e de apoio, a equipe toda, o tanto de gente que nos ajudou a contar essa história e as pessoas para quem o filme foi feito, todos verão o resultado do esforço deles numa sessão presencial no bairro onde filmamos tanta coisa, e isso é um sonho. Eu só espero que o filme honre toda essa energia”.
O 28º Festival de Cinema de Vitória – Reencontro conta com o patrocínio do Ministério do Turismo e da ArcelorMittal, através da Lei de Incentivo à Cultura. Conta com apoio do Canal Like e da Universidade Federal do Espírito Santo e apoio institucional da Rede Gazeta. A realização é da Galpão Produções e do Instituto Brasil de Cultura e Arte (IBCA).
Este projeto está sendo realizado com recursos públicos do Governo do Espírito Santo viabilizados pela Lei de Incentivo à Cultura Capixaba, da Secretaria de Cultura.
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