Diretora de “Pastor Cláudio”, Beth Formaggini avisa: “É um filme difícil de ser assistido. É opressivo.” Recorte sobre um período marcante para o Brasil – a ditadura militar -, o documentário abriu a 8ª Mostra Competitiva Nacional de Longas-Metragens no 25º Festival de Cinema de Vitória e saiu vencedor do principal prêmio: Melhor Filme da Mostra Competitiva de Longas, eleito pelo júri técnico. 

O filme mostra o encontro do psicólogo e ativista Eduardo Passos com Cláudio Guerra, o bispo evangélico e ex-chefe da Polícia Civil, responsável por assassinatos, desaparecimento e ocultação de cadáveres de opositores da ditadura civil-militar no Brasil. Lançado em 2017, o documentário foi exibido em festivais nacionais e internacionais, como o Festival do Rio e o Festival de Havana. 

Em Vitória,  Beth Formaggini falou sobre o longa e como ele ganha ainda mais importância  no momento político atual. Confira abaixo:

O Pastor topou participar do documentário logo de início?

Topou. Ele já tinha escrito um livro, já tinha falado em um programa Observatório da Imprensa, do Alberto Dines. Ele aparentemente gosta de falar. Por um lado se mostra muito orgulhosos do que fez, diz que gostava do poder. Por outro lado acho que se arrependeu. Eles ganhavam prêmios pelas mortes. Era um sistema como pistolagem. Encomendavam as mortes, desapareciam com os corpos. Isso acontece no Brasil até hoje. Veja a Marielle. O Amarildo. O Brasil é um país que tem muita violência, principalmente policial.

O público tende a se chocar com o conteúdo do filme?

As pessoas ficam muito chocadas porque elas não sabem o que aconteceu na ditadura e acontece nos porões da polícia hoje. E aí escuta a pessoa que foi autora dos crimes… Muitas vezes se escuta a vítima falar, mas a pessoa que fez, a gente não conhece o ponto de vista. A maioria das pessoas envolvidas com esse tipo de violência têm um pacto de silêncio. Elas não falam. Você vê a frieza com que ele fala das mortes… Você pensa: “Nossa, o ser humano é assim também.” Enquanto isso a sociedade se cala, joga pra baixo do tapete. “Não tenho nada com isso.” É uma coisa que não acabou com a ditadura. Ainda acontece no Brasil.

Há poucos meses foi divulgado um documento da CIA que revela a participação dos militares nos assassinatos.

O presidente Geisel. Existe uma facção que diz que as mortes foram causadas por um grupo de coronéis de extrema direita. Mas com esses documentos está provado que o Estado brasileiro tinha uma política de extermínio. Como eu acho que hoje existe uma política de extermínio dos jovens negros da periferia. Isso se chama segurança pública: manter o capital faturando e as pessoas em casa, amedrontadas. Por que a população não vai pra rua? Porque o pau come. A gente acha que está numa bolha, mas não está. Os tiroteios estão acontecendo ali, no meio da rua. Enquanto não chegar no quintal da casa das pessoas, elas acham que não é com elas. Mas está chegando.